Mohamed Salah, o respeito ao tempo e o amadurecimento

Gabriela Montesano
3 min readMay 2, 2018

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Crédito: Liverpool FC

Os números de Salah na temporada são impressionantes. Já são 43 gols e 15 assistências em 48 jogos até agora. Não à toa, o egípcio do Liverpool vem ganhando cada vez mais admiradores ao redor do mundo. Assunto em pauta, Mohamed Salah foi um dos temas mais abordados na coletiva de Jürgen Klopp antes da partida válida pela semifinal da Liga dos Campeões contra a Roma nesta quarta-feira. Questionado sobre o crescimento no desempenho de Salah, Klopp foi direto. Poderia exaltar seu esquema tático, seu elenco ou as qualidades do jogador (todos pontos válidos para explicar), mas não o fez. Trouxe uma verdade clara à tona afirmando que nem todo jogador se torna um goleador aos 18 anos de idade e afirmou que ele simplesmente amadureceu.

Salah tem 25. Indiscutivelmente vive sua melhor temporada. Os números e as atuações quase irreparáveis não deixam mentir. Mas não foi um Neymar, um Leroy Sané, um Gabriel Jesus ou mesmo um Mbappé para despontar tão cedo. Então como explicar o que aconteceu? Para entender essa aparição tardia para o futebol na atualidade é preciso olhar para o contexto. Sempre é preciso. Não se pode conhecer apenas um pedaço da história para compreender o presente e projetar o futuro.

Mohamed Salah nasceu e cresceu no Egito, um país de pouca tradição na formação de jogadores de futebol. Mesmo assim persistiu e, com 14 anos, assinou seu primeiro contrato com o Al Mokawloon. Talentoso, demorou pouco para que Salah precisasse passar pelas primeiras mudanças na sua carreira. Mal sabia que seriam muitas até encontrar seu melhor momento. Primeiro deixou de ser lateral-esquerdo e passou a atuar no ataque, como faz hoje no clube inglês. Depois veio a promoção à equipe profissional, o sonho de qualquer garoto, com apenas 16 anos. Em dois anos o atleta precisou se mostrar pronto para o time principal. Foi bem, mas enquanto se desenvolvia, o massacre no Estádio Port Said, com a morte de 74 pessoas, interrompeu a carreira do atacante no clube com a suspensão do campeonato por dois anos.

Sem contrato, com 19 anos, foi a seleção que o ajudou a mudar esse cenário e em uma partida amistosa contra o Basel o caminho se abriu novamente para Mo Salah. Uma chance de ouro de mudar para a Suíça e mostrar seu potencial. Note-se: mais uma mudança brusca. Deixar o país de origem, língua desconhecida e distância da família, além da própria adaptação a um novo ambiente de jogo. Mesmo assim, a qualidade do jogador, em duas temporadas, rendeu 20 gols em 79 partidas.

Mais adaptado a vida europeia, na temporada seguinte, em 2014, Salah se transferiu para o Chelsea e viu seu futebol cair de produção. Outro momento difícil de superar. Foi usado como moeda de troca e parou na Fiorentina, onde começou a recuperar a confiança e viu os gols voltarem a aparecer. Chamou a atenção da Roma e mudou de novo. Após dois bons anos no clube, recebeu a proposta do Liverpool. Um pedido especial de Jürgen Klopp.

Foi apenas em 2017 que Mohamed Salah vestiu pela primeira vez a camisa dos Reds para construir a história que vemos hoje. Quase nove anos se passaram desde a sua estreia profissional no Egito e cinco clubes diferentes ficaram pelo caminho para que ele chegasse ao seu melhor momento no clube inglês. Uma longa jornada. Klopp tem razão quando diz que o Liverpool tem sorte de contar com o atacante no presente. Em outro tempo poderia ser mais um pedido de desculpas da diretoria pelo alto investimento e pouco resultado.

A história de Salah ensina que é importante lembrar que o amadurecimento nem sempre corre junto com o relógio biológico. É um processo diferente em cada caso. Sejamos sinceros: quantos de nós estávamos prontos para seguir carreira aos 16 anos? Então por que descartamos tão facilmente e deixamos talentos pelo caminho por não estarem maduros o suficiente no nosso tempo?

Hoje, Mohamed Salah é a grande prova de que é preciso respeitar o tempo. O tempo e o contexto de cada jogador. Essa verdade não pode ser esquecida no sucesso presente. É, sim, preciso olhar para o passado e às vezes regular os ponteiros para acertar o tempo. Para Salah eles se alinharam agora, mas nem todos têm a mesma sorte.

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